O Novo Técnico da Seleção e o Nosso Arroz e Feijão
- Bob Wilson
- há 3 dias
- 3 min de leitura
Ao saber do nome do novo técnico da seleção, tentei escrever um conto sobre um técnico estrangeiro que chega ao Brasil e transforma nossa Seleção num carro italiano. Acabei escrevendo uma crônica. É que toda vez que penso no novo técnico da Seleção, não consigo ficar só no campo tático. Acabo escorregando pro emocional — e olha que nem entrei em campo.
O nome dele? Carlo Ancelotti, mas vamos chamá-lo de “O Gringo”, por enquanto. Porque, sinceramente, não importa se ele é italiano, espanhol ou croata. O que importa para a CBF, pelo visto, é que ele não é brasileiro. E isso, meu amigo, já basta pra metade do país perder o sono.

"Tem que ser brasileiro, pô! Futebol é coisa nossa!", disse o meu tio Sérgio no almoço esbravejando no grupo da família. O mesmo tio que jura que Messi joga mais que o Pelé “com uma perna só e um olho vendado”.
Mas aí vem o outro lado. "A gente precisa de método! De alguém que organize a casa!", rebateu minha prima Gabriela, fã do Guardiola. Pra ela, o novo técnico da seleção é tipo um estilista italiano montando moldes para costureira. Cada peça no seu lugar.
O Brasil, por outro lado, sempre foi mais tipo um artista de rua que faz escultura com arame e papelão. E, convenhamos, já ganhou cinco Copas assim.
E é aí que começo a pensar: o futebol brasileiro tá mudando ou a gente que parou no tempo? Nossos jogadores, mal completam o ensino médio, e já estão sendo vendidos pra clubes europeus como se fossem vinho raro, safra 2006, com notas de improviso e aroma de finta desconcertante. Mas ao chegarem lá, ganham um tapa europeu: deixam de ser protagonistas e artistas pra virarem operários da bola. Cada passe e passo, milimetricamente pensado. Cada drible ensaiado. Criatividade sob vigilância.
Vinicius Jr., por exemplo. Um moleque que aqui era alegria pura, ousadia no pé. Na Espanha, amargou banco, depois virou protagonista, mas com isso, veio o racismo. Virou símbolo de resistência (e nesse campo joga sozinho por lá). Pega racismo vindo da arquibancada e devolve com gol e dança. E o Gringo? O que ele falou? Se posicionou? Ele até que não fugiu da pergunta. Na coletiva, defendeu o garoto, cobrou justiça. Mas só. Nada revolucionário. Eu gostaria de mais efetividade na ação. Mas... será que ele entendeu a dor? A raiz da coisa? Ou foi só um discurso bem-ensaiado com assessoria de imprensa ao lado?
Enfim, acho que ele fez o que pode, mas falar é pouco.
Sobre o novo técnico, a imprensa, claro, se dividiu.
Juca Kfouri escreveu:
"o Brasil se rendeu ao estrangeirismo, como se não tivéssemos história".
Já Mauro Cezar defendeu:
"Não é sobre nacionalidade, é sobre competência."
E eu? Eu continuo escrevendo e pensando. Se o futebol brasileiro é arte, será que dá pra ensinar arte com PowerPoint? Será que um técnico estrangeiro entende que a gente não joga só por resultado, mas por poesia? Que um gol na raça vale mais que posse de bola?
Ou será que essa ideia de "arte" é só nostalgia nossa (ou minha)? Uma desculpa bonita pra esconder que, hoje, nossos artistas jogam num palco europeu, com figurino padronizado e coreografia repetida.
Será que o brasileiro se resume a resultados? Resultados a qualquer custo?
O Gringo pode ser bom. Aliás, ele é bom (negar que é um dos melhores, e idiotice). Ele pode até levantar a taça. Mas será que ele vai entender que aqui, futebol é mais que esporte? Que é pão no café da manhã, assunto de elevador, desculpa pra faltar no trabalho? Que é camisa do clube no enterro do avô? Que arroz e feijão vira ingresso na mão de torcedor fanático?
Talvez sim. Talvez não.
Mas uma coisa eu sei: se um dia ele fizer a Seleção jogar como a gente sonha, com liberdade, com ginga, com alma, com raça, aí, meu amigo, ele deixa de ser “O Gringo”, ganha um apelido carinhoso melhor que esse e vai virar meme nacional.
O trabalho do gringo é conseguir fazer com que todo um país volte a se identificar com está seleção que a muito, não faz nem a gente ligar a TV para assistir o jogo dela.
É isso que a gente quer. Que ele não só treine, mas entenda. Que não só ganhe, mas emocione.
Porque, convenhamos: Eu entendo o valor dela, mas eu não sonho com tática. Eu sonho e vibro é com histórias, com jogadas que ninguém mais faz pelo mundo, com golaços.
Desejo toda a sorte do mundo pro gringo. Acho que ter ele em nossa seleção já é um ótimo passo para o hexa (apesar das preocupações que me consomem) e um ótimo tapa na cara dos xenófobos e conservadores de plantão (e isso já me rende histórias demais para acompanhar).
Ansioso pelo hexa,
Bob Wilson.
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