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Meu Corpo Se Demitiu de Mim

Outro dia, meu corpo se demitiu de mim.


Acordou com a lombar travada, os olhos secos, a mente frita e avisou: “Eu vou embora. Cê que se F*D@ com o resto aí.”


O motivo? O tal do Burnout.


Mas um burnout com sotaque artístico. Um burnout que usa boina, mas já nem pinta mais. Que usa cinto de rebite e moicano, mas que já não toca mais punk songs em sua guitarra.



Sou empresário (que palavra merda essa) no ramo da cultura. Sim, isso mesmo. Além destes textos de gosto duvidoso que vos escrevo, eu vivo de arte e cultura. Ou pelo menos, tento. E a arte, coitada, anda me devendo algumas sessões de psiquiatra e um final de semana no sofá sem culpa.


Tentar viver de arte é fingir que é dono do seu tempo, quando na verdade você está o tempo todo preocupado com o dinheiro mês seguinte.






E como se não bastasse o pavor da não estabilidade financeira, ainda sou obrigado a escutar em toda festa de família o que pensam da minha pessoa e expressam em piadinhas que geram risos em todos e sentimentos conflitantes em mim: Que eu durmo até meio-dia. Que eu vivo em rolês bebendo e usando drogas. Que orgia e surubas são frequentes no meu dia a dia.


Carrego aquele velho fardo ancestral: o da masculinidade provedorística™, como se cada hora parada longe do computador fosse um crime contra o PIB da família. Então, você tenta. Trabalha feito um doido. Finge que empreender em cultura é só abrir um Instagram bonito e voilá. A realidade? É abrir o e-mail, o WhatsApp, o Canva, o Excel, o Google Drive, tudo ao mesmo tempo, 24h por dia e quando chega email's e mensagens tem só você para responder e dar conta de tudo, e quando não chega, você fica de minuto em minuto olhando computador e celular para ver se pintou algo novo.

Enquanto isso, os hobbies que me faziam lembrar quem eu era... viraram lendas. O violão e a guitarra? Estão servindo de decoração na parede da sala. Os amigos? Viraram stories que eu reajo com coraçãozinho e um “vamos marcar” que nunca vem. A criatividade? Fugiu com a paciência. Até a leitura tive que trocar por audiolivros que escuto em momentos onde preciso aliviar a mente, mas não posso parar de trabalhar.


Me sinto um chato nos últimos anos. Aliás, isso aconteceu ao mesmo tempo que virei ME.


E no fundo, o que mais dói nem é o bolso ora vazio, ora cheio. É o olhar atravessado de quem acha que viver de arte é um capricho, tipo querer plantar lavanda no deserto.“Mas você não quer arrumar um emprego de verdade?”. Ah, amizades, se eu ganhasse um real por cada vez que ouvi isso... eu já teria, enfim, um emprego de verdade.


Me apego ao fato que, entre um caos e outro, eu sei que meus trabalhos fazem a diferença na vida de muitos. Tô alimentando bocas. Tô colocando e amplificando ideias que acredito no mundo. Tô questionando o que precisa ser questionado. Tô abrindo rachaduras em paredes sólidas que protegem os safados que tentam governar esse mundo.


Amo o que faço, mas sempre sou lembrado que dinheiro e saúde física e mental, também é amor.



Precisando de um corpo novo,

Bob Wilson

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