Aqui estou eu, um escritor de meia-idade, cético até a última fibra capilar, escrevendo sobre o famigerado "inferno astral". Talvez você saiba o que é isso, enquanto eu, fui descobrir recentemente depois de uma série de desventuras.
Caso algum extraterrestre (feito eu) não saiba o que é isso, o "inferno astral" é aquele período de 30 dias que antecede o aniversário de uma pessoa. Segundo os especialistas em astrologia, baseados em nada nadinha, esse é um momento de grandes desafios, reflexões e, claro, infortúnios. Os astrólogos afirmam que durante esse período, a posição do Sol em relação ao nosso signo causa uma série de desventuras e introspecções profundas.
Para mim, a introspecção só se deve ao fato de que mais um ano se passou e, no geral, nada mudou a não ser o fato de que o ceifador de vidas está cada vez mais próximo.
Curiosamente, ao buscar mais informações sobre essa calamidade celeste, deparei-me com algumas fontes que explicam que o "inferno astral" não tem qualquer embasamento científico (quem diria). Astrólogos renomados (ou que assim se dizem) alegam que é um período de limpeza energética, onde enfrentamos nossos piores medos e desafios para renascer renovados em nosso aniversário. Já se foram quase 40, e nada, nunquinha, de forma alguma, se renovou a cada data do meu aniversário. Me desculpem a intolerância (risos).
Como um homem que preza pelos dados concretos, fui em busca de algo mais palpável. Encontrei um estudo fascinante da American Psychological Association, que conclui que a nossa percepção de períodos ruins pode ser amplificada por vieses cognitivos. Em outras palavras, se acreditamos que vamos passar por um inferno astral, qualquer tropeço no tapete vira um terremoto de magnitude 7.0. E meus colegas leitores, sinceramente, vivo um inferno astral desde que precisei a começar limpar minha bunda sozinho aos 3 anos de idade.
Decidi então testar essa teoria. Estou, teoricamente, em pleno o meu suposto inferno astral, e dado este momento único, me coloquei mais atento aos infortúnios diários. Eis um pequeno resumo:
Perdi um gol na cara do gol. Maldito seja Mercúrio retrógrado, pensei (mas logo lembrei que este gol já perdi outras 500 vezes).
Minha internet caiu no meio de uma reunião. Só pode ser o alinhamento desfavorável de Saturno. Em nada tem a ver com o péssimo serviço da vivo.
Perdi meu ônibus e tive que esperar 30 minutos pelo próximo na chuva. Claramente, Marte estava em guerra com Júpiter.
Minha estante de livros quebrou no meio de uma madrugada e me assustou MUITO. Logo pensei que o Sol havia se rebelado a sua escravidão cósmica e optado pelo fim da poesia humana.
Minha mulher me traiu. Brincadeira. Só para ela ler e ficar brava essa aqui.
Brincadeiras a parte, ao revisar esses e outros acontecimentos, percebi que eles poderiam ter ocorrido em qualquer outro período do ano. O gol perdido? Bem comum a minha realidade física de jogador de várzea. A internet? Culpa da provedora de serviços. O ônibus? Horário de pico. Minha estante? Montei igual minha cara (toda errada) quando me mudei. Nada de astros envolvidos aqui, apenas a boa e velha vida cotidiana jogando suas peças.
Confesso que, no final das contas, comecei a encontrar certa diversão em culpar os planetas por minhas desventuras. Afinal, é mais poético pensar que os deuses do Olimpo estão se divertindo às minhas custas do que aceitar minha própria falta de sorte e competência.
Ao término do meu inferno astral, provavelmente não irei renascer como uma fênix das cinzas, mas sim como um homem mais cético e bem-humorado. Porque se tem algo que esses 30 dias estão me ensinando, é que rir das adversidades é muito mais eficaz do que culpar Vênus e seus caprichos.
Para aqueles que acreditam, nada contra. Não caçoo de vocês. Eu por exemplo, acredito muito, com todas as minhas forças, no Corinthians. Para os céticos, não sejam assim. De ouvidos a tudo e a todos e lembre-se que você também tem seu "conto de fadas" que só você e mais uns 15 loucos acreditam. E para mim, um brinde ao próximo ciclo, onde, sem dúvida, novos infernos e paraísos astrais me aguardam, mesmo que sejam apenas mais uma invenção da minha mente engenhosa.
Aguardando o fim deste inferno,
Bob Wilson
