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Foto do escritorGoretti Giaquinto

Quase Assassina. Por Pouco.


Mulher em um ônibus, olhando para o exterior, com tristeza interior.
Carrego uma dor que me leva a maquinar uma forma de me livrar dessa prisão. Que despertou a versão assassina alimentada pela convivência com alguém que não me ama como mereço. (Imagem IA - DALL-E 3)


Tenho focado a atenção nas séries policiais — e como são muitas! 


Não sou uma assassina em potencial, mas explico por que meu interesse se voltou para o assunto: estou cansada de sofrer e me sentir paralisada. Uma mulher apaixonada que se entregou a um conto de fadas que se transformou numa prisão. Estou no meu limite.


Cansei de acordar destroçada para fingir um dia a dia que não me atrai mais. Cansei de palavras carregadas de um ódio que desconheço o motivo, alternadas com doces palavras em que não acredito mais. Capricho na arrumação da casa que esconde lágrimas  em paredes onde fui arremessada inúmeras vezes, acompanhada de palavras que me transformam em nada.


Carrego uma dor que me leva a maquinar uma forma de me livrar dessa prisão. Que despertou a versão assassina alimentada pela convivência com alguém que não me ama como mereço.


Acompanhar os casos policiais me fez bolar o assassinato e plano de fuga.  Eu, que não mato nem uma mosca, tive onde me inspirar.


Segui os perfis do meu marido nas redes sociais, criando um perfil falso. Descobri que o homem das redes não era o que descarregava uma fera sobre mim, sem remorsos, arroxeando-me em coitos dolorosos. Era um homem que se mostrava amável entre presas indefesas.


Adquiri facilmente uma arma, em um ponto de revenda do subcrime da cidade. Aprendi a usar no YouTube.  Com o perfil falso, me dispus a “flertar”. Tinha que arriscar algo mais concreto, onde pudesse pôr em prática um plano que só tinha de efetivo o desejo de pôr um fim ao meu sofrimento. Nada mais importava.


Me tornei insinuante, no perfil. Recebi emojis de flerte, e recadinhos cada vez mais ávidos por encontros furtivos onde pudéssemos nos liberar.


O encontro foi marcado para a sexta seguinte, num lugar afastado da cidade, previamente pesquisado. Analisei o que deveria fazer para encobrir provas, meus rastros. Tomaria vários ônibus até o local, no dia, com roupas sobrepostas que seriam descartadas de forma aleatória — como tinha visto nas séries.


Com o coração aos pulos, vestindo a personagem resultante de todo o processo investigatório, saí para cumprir meu destino. Sentia que ia vingar todas as mulheres traídas, humilhadas e espancadas que desfilavam nos noticiários como produtos descartados pelos monstros de sua proximidade — que demoliram seus ingênuos castelos de amor.


Quando estava próxima ao local, no último ônibus, vi uma mulher, como se lendo meu pensamento, balançando a cabeça negativamente. Acordei do pesadelo. Senti que meu anjo estava me seguindo.


Eu não podia estragar minha vida dessa forma. Merecia ser feliz. Tinha uma criatividade maior do que a usada pra bolar um assassinato, enveredada num ranço da vingança entremeado com o ciúme da mulher traída. A um passo de virar assassina confessa.


Desci do ônibus. Fui pra rodoviária, e peguei o destino que meu olhar me apontou, sem saber onde me levaria.


Me senti livre.




 

Goretti Giaquinto

Desafio #73 de 365

Tema: Crime Premeditado

Crie um plano infalível para matar alguém, mas desista!

O que importa é o plano, não o crime. Um texto narrativo com passo a passo, ferramentas, armas, horários, locais e um claro motivo.

Conte tudo isso e o motivo pelo qual desistiu, em até 1000 caracteres.


Este texto é ficcional, baseado em acontecimentos que podem ser reais — infelizmente. Não consegui em apenas 1000 caracteres, pois tentei mostrar um lado que quase ninguém enxerga. O lado mais fraco.

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