O episódio com Silvio Almeida, dentre muitos sentimentos gerados, gerou um sentimento de quase tristeza coletiva. Não foi algo somente sobre o indivíduo, foi como se parte da luta antirracista e pelos direitos humanos, tivesse terminado.
Confesso, que inicialmente também nutri essa sensação. Mas, posteriormente lendo, vendo e escutando outras pessoas, percebi que era algo equivocado: Silvio Almeida por mais importante que seja, é apenas uma pessoa. E as lutas continuarão com, sem ou apesar dele.
Acontece com Silvio Almeida, o que o próprio condena em seu livro "racismo estrutural", quando se refere ao conceito do "negro único", ou seja, uma única figura passa a ser vista como representante/voz de um grupo, como se não existisse e não houvesse necessidade de outras pessoas.
O conceito de "figura única" assola basicamente todos os grupos minoritários/marginalizados.
Em um exercício rápido:
Negro(a): Silvio Almeida ou Djamila Ribeiro;
LGBTQIAP+: Érica Hilton;
Pessoa com deficiência: Ivan Baron
E assim sucessivamente.
Tal fenômeno ocorre principalmente pela propagação do distorcido conceito da representatividade, onde basta poucas, ou mesmo uma pessoa ser alçada como representante/voz/visibilidade de um determinado grupo, que o mesmo já está representado em todas as esferas sociais.
Obviamente esta prática, causa a individualização e personificação de assuntos e lutas coletivas, como se "os escolhidos" fossem os guardiões e paladinos de seus assuntos e sem eles, as respectivas lutas deixam de existir. E sem dúvidas, para a manutenção do Status Quo, é melhor ter "filhos únicos" do que muitos.
Como diriam nossos avós: Uma Andorinha só não faz faz verão, ou seja, não se conquista nada sendo uma voz solitária, a não ser status individual.
Secundariamente, esse fenômeno ocorre pela nossa necessidade de se escorar em ídolos, pessoas para se espelhar e seguir, o que parte da nossa falaciosa necessidade de nos mostrarmos preocupados e antenados em todas as causas. "Claro que eu me preocupo com causa tal, eu acompanho( pode completar com Silvio Almeida, Ivan Baron, Erika Hilton, tanto faz)". E claramente é mais fácil escorar esse falso anseio, em indivíduos e não na coletividade de fato.
Portanto, precisamos de menos representatividade e mais inclusão, no sentido de que não precisamos das vozes de figuras escolhidas, precisamos que muitas vozes sejam ouvidas.
Pessoas são falhas e são só pessoas, então causas e lutas não podem depender de figura X ou Y.
PAULO FABIÃO
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